Digitalização de silos e secadores ganha força, mas esbarra em gargalos de financiamento
Esperança é que a nova linha do BNDES para máquinas e equipamentos 4.0 dê fôlego ao setor
A digitalização dos silos e secadores, uma das últimas fronteiras da automação no agronegócio, começa a ganhar tração no país, e a esperança é que a nova linha do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) para máquinas e equipamentos 4.0 dê ainda mais fôlego ao setor.
Fabricantes de sistemas de monitoramento e controle como Procer e PCE relatam aumento na procura por soluções que reduzem perdas, elevam a eficiência energética e tornam as operações mais seguras. Mas os avanços ainda esbarram em gargalos de financiamento e na resistência de parte dos produtores em investir no pós-colheita.
“Hoje, 100% dos equipamentos que vendemos pela Kepler Weber já saem com algum tipo de automação”, afirma Jean Oliveira, diretor comercial da Kepler e da Procer. “O desafio agora é fazer com que os sistemas saiam cada vez mais automatizados de fábrica.”
Segundo a empresa, a automação passou a ser um diferencial de performance e segurança. Nos silos, os sensores monitoram temperatura e umidade e acionam automaticamente os ventiladores no momento ideal, sem necessidade de intervenção humana.
“Com a dificuldade cada vez maior de obter mão de obra no campo, essa é uma demanda cada vez mais recorrente”, completa Murilo Schneider, fundador da Procer, que atua há duas décadas no setor e cujo controle está nas mãos da Kepler desde 2022.
Nos níveis mais avançados, o controle atinge também o secador e o sistema de geração de calor — fornalhas e caldeiras automatizadas que regulam o abastecimento de biomassa e o acendimento, melhorando a eficiência e reduzindo o risco de acidentes. “A operação é mais estável e o grão fica mais homogêneo, o que aumenta a qualidade final”, diz Schneider.
A digitalização traz ganhos mensuráveis. Segundo a Procer, um sistema automatizado pode evitar perdas comuns nos silos. Considerando preços médios de R$ 120 a saca de soja e R$ 65 a de milho, a economia chega a R$ 1,36 e R$ 0,86 por saca, respectivamente. A armazenagem média de quatro meses e meio amplia esse retorno, especialmente para quem cultiva safrinha.
O investimento para uma unidade média, com quatro silos, gira em torno de R$ 100 mil — cerca de R$ 25 mil por silo —, além da assinatura mensal de software e assessoria técnica. A Procer, que tem forte atuação junto a fabricantes de equipamentos como Kepler Weber, Comil e GSI, estima que 45% do parque instalado no país utiliza alguma tecnologia da empresa.
Mas boa parte dos cerca de 200 milhões de toneladas de capacidade estática de armazenagem no Brasil ainda não está conectada. “Há muitos sensores já instalados que não são usados em tempo real. Nossa proposta é digitalizar o que já existe, como se fosse instalar um GPS em um carro que ainda não tem sistema de navegação”, compara Schneider.
Apesar da demanda consistente, o cenário macroeconômico limita a expansão. “O mercado está otimista, mas o preço das commodities e as taxas de juros ainda freiam os investimentos”, afirma o executivo.
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Sistema automatizado pode evitar perdas comuns nos silos — Foto: PCE / divulgação
Linha pode acelerar eficiência
Uma das esperanças para reduzir esse gargalo vem da nova linha do BNDES que já aprovou R$ 1,3 bilhão de empréstimos desde o lançamento, em 25 de agosto. Com taxas incentivadas, o orçamento disponível em 2025 é de R$ 10 bilhões.
“O campo e a indústria precisam de ferramentas tecnológicas para ganhar eficiência, essa linha pode acelerar o processo”, disse Everton Zanini Rorato, um dos sócios da PCE Automação, sediada em Panambi (RS), mesma cidade da Kepler, que, por sua vez, estuda como usar a linha para financiar a automação aos seus clientes.
“As cooperativas já entenderam que não faz sentido construir uma nova unidade sem automação. O produtor individual, porém, ainda não enxerga a armazenagem como parte essencial do processo produtivo”, avaliou Rorato.
Fundada por engenheiros elétricos com experiência em setores industriais e portuários, a PCE começou a focar o agronegócio em 2015, com soluções de termometria digital, controle de aeração e painéis de automação. O sistema, hospedado em nuvem e acessado por portal seguro, permite monitorar em tempo real o desempenho de silos, secadores e máquinas de limpeza, além de ajustar parâmetros de temperatura, ventilação e energia.
“Nos silos, o sistema só liga os motores nos momentos certos, o que racionaliza o gasto energético e reduz a necessidade de mão de obra. No secador, garante que o grão seja processado dentro da faixa ideal de temperatura, evitando desperdício e contaminação cruzada”, explica Rorato.
A automação, segundo ele, representa entre 10% e 20% do custo total de uma instalação elétrica. Mesmo assim, é um investimento que tende a se pagar com eficiência, economia de energia e redução de perdas. “É um caminho sem volta”, diz o engenheiro.
A PCE faturou cerca de R$ 50 milhões em 2024, metade vinda do agronegócio. Apesar do ano difícil, com juros elevados e produtores mais cautelosos, a empresa aposta no amadurecimento do mercado e na pressão das exportações por padrões de qualidade mais rigorosos.
“O controle da armazenagem vai ser tão importante quanto o do plantio. As exigências para exportar estão aumentando — hoje se mede teor de proteína, gordura e até a eficiência da secagem. Sem automação, o Brasil não vai sustentar esse nível de competitividade”, afirma Rorato.
Para Schneider, da Procer, a tendência é que a automação deixe de ser uma “opção” e passe a ser o padrão. “A indústria automobilística já fez essa virada. Agora é o pós-colheita que está levando o mesmo conceito de segurança e precisão para dentro dos armazéns.”
Fonte. https://globorural.globo.com/infraestrutura-e-logistica/noticia/2025/11/digitalizacao-de-silos-e-secadores-ganha-forca-mas-esbarra-em-gargalos-de-financiamento.ghtml
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